No lugar das rodas é envolvido o objeto locomotivo por um largo tecido emborrachado. O volante, a despeito de toda ilusão que propicia de controle, deserve-se para algo; é pêndulo deslocado que anuncia, ironicamente, na sua, a circularidade inexistente em qualquer outra parte – no tempo, no uso que faz-se do espaço. Nesta cidade as ruas foram substituídas por pátios de deslize em que carrinhos tromba-tromba ou bate-bate deambulam, afetando aos empurrões os percursos uns dos outros. Ah, se soubessem antes o lugar da dissolução da propriedade; arquitetos teriam sido Bakunin, Malatesta, Kropotkin...: bastou tirar da rota o destino.
Tirado o regimento, não havia mais possibilidade de retorno. A janela da casa engolindo a cidade, fazendo cabê-la dentro de seus muros. Tudo quanto era encosto e conforto foi se nomeando casa, tudo quanto era espaço de produção, apropriado como trabalho. Não havia mais como voltar ao mesmo local todos os dias, os esbarrões poriam os sujeito a seguir rotas antagônicas a de seus desejos que, por outro lado, aos poucos ganharam a mesma capacidade metamórfica, uma liquidez incontrolável, tornado-se sempre invariavelmente outro, inapreensíveis linhas de fuga. Ali, tudo que ocupava intervinha, os cruzamentos como pontos de tomada de posse do destino: lombadas, postes, pessoas (objetos vivos, não vivos ou, quiçá, Odradeks); a malemolência dos perigos, dos corpos ocupantes do espaço e, aos poucos, a impossibilidade de aplicação dos pronomes possessivos a qualquer objeto. Nada poderia pertencer à, e as coisas acabavam pertencendo por um tempo a si mesmas, depois nem a si - hasta la disolución del pertencimiento....
Instantia Crucis, 1º dia do outono de 2010